Monday, July 8, 2013

¡ADIÓS CAMPEÓN TEÓFILO STEVENSON!*


TEÓFILO STEVENSON LAWRENCE, o lendário pugilista cubano, vencedor de três medalhas de ouro olímpicas, Munique 1972, Montreal 1976 e Moscovo 1980 – feito conseguido por apenas dois outros pugilistas, o hungaro Lázló Papp e o seu compatriota Félix Savon –; vencedor de igual número de Campeonatos Mundiais de Boxe Amador, Havana 1974, Belgrado 1978 e Reno 1986, e de outros tantos inúmeros títulos do boxe amador – tantos quantos havia por conquistar –, Teófilo o gigante de 1.90 metros de altura que dominou o boxe amador mundial nos anos 70 e meados de 80, com a sua poderosíssima direita, jogo de pernas e elegância no ring, o grande Campeão nascido em Las Tunas a 29 de Março de 1952, sucumbiu na passada segunda-feira 11 de Junho de 2012, com 60 anos de idade.

Em Janeiro de 2012 a saúde do Campeão vacilou e teve de ser internado cerca de duas semanas: um coágulo em uma das artérias próximas do coração. Teve alta; todavia não resistiu e foi “knockouteado” por uma cardiopatia isquémica que o enviou definitivamente para o outro mundo – a notícia e causas da sua morte foram avançadas pela imprensa oficial cubana.

Nos jogos olímpicos de Munique, com 20 anos de idade, Stevenson, cruzou nos quartos de final com norte-americano Duane Bobick, “a esperança branca” do pugilismo peso-pesado amador, meldalha de ouro dos jogos Pan Americanos de 1971. Bobick, que tinha derrotado Stevenson nos referidos jogos, era favorito. Todavia ante a surpresa geral, Pirolo – assim era conhecido o cubano –, depois de um início desfavorável nos dois primeiros rounds, enviou o norte-americano ao tapete três vezes no terceiro round, forçando o árbitro a interromper o combate. É um dos combates mais famosos de Teófilo. – Em pleno período da guerra fria entre o este e o oeste, e sendo Cuba um dos países da linha frente da referida guerra, não é difícil imaginar o impacto que esta e outras vitórias de Stevenson tiveram no discurso político contra “o imperialismo norte-americano”.

Depois da conquista do ouro em Munique, os caça talentos norte-americanos apercebem-se do quão dotado era o gigante cubano. Surgiram as propostas, os dólares, milhões e milhões – fala-se de até cinco milhões! –, postos na mesa para Stevenson com uma condição e um sonho: tornar-se profissional e lutar com Cassius Clay (Mohammad Ali) – os especialistas do boxe norte-americano acreditavam que o cubano tinha chances de vencer Ali. Todavia, fiel aos ideias socialistas, à Pátria, à revolução e al Comandante Fidel Castro Ruz o Campeão deitava por terra as ofertas milionárias de um Don King que não tinha dúvidas: seria fenomenal como profissional. Tem a mesma classe que Ali e Frazier. Porém Pirolo ripostava: que são os vossos milhões de dólares comparados com o amor de 8 milhões de cubanos que eu tenho? Ou ainda, não creio em profissionalismo, eu creio na revolução. Fidel Castro exultava e exaltava as virtudes patrióticas e revolucionárias do grande Campeão que demonstrava assim que nenhum dinheiro capitalista podia comprar uma consciência revolucionária.

Com o passar do tempo e o cimentar do domínio de Stevenson no boxe amador, e Ali no profissional, outras tentativas de colocarem frente a frente os dois melhores peso-pesados amador e profissional continuaram, todavia havendo sempre um obstáculo, ora porque os cubanos exigiam que o combate acontecesse sem Teófilo se converter ao profissionalismo, ora porque o número de rounds não satisfazia uma das partes, etc. A dura realidade é que escasseou o tempo e o muito ansiado desejo de milhões de fãs nunca teve lugar.

Depois de vencer tudo que havia para vencer como amador, Teofilo Stevenson Lawrence retirou-se dos rings em 1988 com 36 anos de idade, com o impressionante record de 302 vitórias e 22 derrotas.

Fora dos rings, Pirolo dedicou-se a formar e a inspirar novas gerações de pugilistas amadores cubanos, sendo Félix Savon o melhor bem sucedido, com igual número de três títulos de ouro olímpico. Por altura da sua morte era vice-presidente da Federação cubana de boxe. Todavia, passou também a dedicar-se a outra atividade: grande consumidor de bebidas alcoólicas. O seu nome passou amiúde a ser associado a escândalos por embriaguês.

A propoósito da sua morte, Fidel Castro Ruz voltou a exaltar a fidelidade revolucionária do Campeão: ningún dinero del mundo habría sobornado a Stevenson! Gloria eterna a su memoria!

Seria entretanto interessante saber se Stevenson manteve a mesma fidelidade e convicção até ao final da sua vida. A mesma convicção de que teria feito a melhor opção ao recusar o profissionalismo e com ele uma vida milionária e de glórias.

Alguns elementos: a) aquando da tentativa falhada de fuga do seu compatriota Guillermo “El Chacal” Rigondeaux, nos jogos Panamericanos do Rio de Janeiro 2009, Stevenson pediu publicamente que dessem a Rigondeaux, a oportunidade de continuar a sua carreira. El Chacal brilha nos dias de hoje no pugilismo profissional.

b) Já retirado, passou a fazer conjeturas sobre o que teria sido seu enfrentamento com Muhammad Ali. Dizia por exemplo que Ali era melhor pessoa do que pugilista. Dizia também que em três rounds ele Teófilo teria vantagem, mas em 15 rounds Ali levaria a melhor fruto da sua experiência como profissional. Em outras alturas dizia que o combate seria empate.

c) Certa vez, recordou: preparei-me muito, com muito entusiasmo e dedicação para enfrentar Clay, a quem consideravam um bom rival para mim, e com o qual havia incluso opiniões divididas sobre o possível vencedor.

d) Em uma entrevista em 2006, depois de lembrar os seus sucessos e as fracassadas negociações, exibiu uma camisa com o logótipo da WBC – World Boxing Council, uma das principais e mais prestigiada organização que rege o boxe mundial –, oferta de reconhecimento da mesma organização; vestiu orgulhosamente e desabafou: que bom teria sido ter um cinturão desta organização!, todavia, logo-logo adotou o discurso politicamente correto: mas estou feliz com os meus irmãos cubanos e o meu comandante Fidel.

Ora, não há dúvidas, longe das ideologias, das revoluções e outras mais convicções, Stevenson sonhava em subir ao ring e defrontar Ali. Sonhava com grandes combates.

Terá o álcool sido refúgio sintomático por algum reconhecimento tardio de uma decisão desacertada e uma carreira profissional voluntariamente deitada a perder por uma causa idiológica na qual acreditou?

Stevenson vs Ali duas lendas, dois mitos pararelos. Um combate que nunca aconteceu todavia continua a especular e apaixonar o mundo do boxe.

Entretanto, um combate que sempre aconteceu, de forma emocionante aquando de uma das duas visitas de Ali a Cuba em 1998 – a outra aconteceu em 1996 –, estando os dois Campeões já reformados, naturalmente. Ambos sobem ao ring em pose de combate. Ali esquece-se do mal de Parkinson que o apoquenta desde 1982 e volta a saltar, volta a dançar graciosamente como fazia nos seus belos tempos. Vai dançando a volta de Stevenson e vai atirando golpes ao ar. Stevenson está em posição de combate, observa Ali e vai também dançando, vai atirando golpes ar. No final da demonstração, os dois pugilistas abraçam-se emocionados.
Teofilo Stevenson Lawrence, um nome, uma lenda do boxe mundial.

Descanse em paz Campeón Teófilo Stevenson!

Por Décio Bettencourt Mateus.


* ARTIGO (com alterações) PUBLICADO NO SEMANÁRIO ANGOLENSE, Ediçao 471, com o título "Adeus ao campeão Teófilo Stevenson".